Um julgamento inédito será realizado nesta quarta-feira (22), às 9 horas, pelos jurados do Tribunal do Júri da comarca de Três Lagoas. Eles apreciarão o caso emblemático na cidade de “tribunal do crime”, em que sete pessoas teriam se reunido e decidido pela morte de um homem suspeito de praticar estupros no bairro.
Valdeir Ferreira Viega, um boliviano de 23 anos, que morava no Residencial Novo Oeste, em Três Lagoas, teve seu corpo encontrado no dia 5 de abril de 2015 por pescadores, próximo à região conhecida como “Lago do Cargil”, no bairro Jupiá, naquela cidade. O homem, que era pessoa com deficiência mental, possuía 15 perfurações de faca espalhadas pelo tórax, face e pescoço, além das mãos amarradas para trás, sobrancelhas raspadas e unhas pintadas, em sinais claros de tortura.
Ao iniciar as investigações sobre o crime, chegou ao conhecimento da Polícia que L.P.B. dizia abertamente ser o responsável pela morte da vítima. Interrogado pelos policiais, o rapaz, de apenas 18 anos na época dos fatos, confessou o delito e todos os seus pormenores, inclusive afirmando ser membro da facção criminosa PCC e apontando as demais pessoas que teriam participado do fato criminoso.
Restou apurado, então, que Valdeir Ferreira Viega era suspeito de cometer abusos sexuais de crianças no condomínio que residia. Assim, no dia 2 de abril daquele ano, a mulher D.G.L. teria entrado em contato com os jovens G.V.D.F. e W.R.M, sendo que juntos entraram no apartamento da vítima, sequestraram-no, e levaram-no à força até um apartamento em outro bloco do mesmo residencial. No local, estariam A.M. da S.S., que teria atuado como “juiz” do caso, e sua esposa M.R. da C., ambos moradores daquela unidade. Logo em seguida, teriam se juntado ao grupo mais três pessoas, M.S.T. dos S., um menor de 17 anos, e L.P.B., que viria a ser o executor do homicídio.
Por cerca de três horas, o grupo torturou a vítima, no intuito de que confessasse as acusações contra si de estupro de crianças do condomínio. Durante as agressões, L.P.B. teria ficado o tempo inteiro ao telefone com membros do PCC, vez que era o “disciplina” daquele bairro, ou seja, a pessoa a mando da facção criminosa responsável por garantir que seu “código de conduta” fosse respeitado.
Segundo relatos dos próprios réus, a vítima teria confirmado a prática dos crimes sexuais, razão pela qual foi sentenciado pelo grupo à morte. L.P.B. então o levou até a região do “Lago do Cargil” e o matou com 15 facadas. Após a morte, o réu ainda teria tentado esconder o cadáver no local.
Em sentença de pronúncia, o juiz Rodrigo Pedrini Marcos, titular da 1ª Vara Criminal de Três Lagoas, pronunciou L.P.B. no crime de tortura, agravado por ter sido realizado mediante sequestro; no crime de corrupção de menor; no crime de organização criminosa envolvendo menor; e no crime de homicídio triplamente qualificado pelo motivo torpe, pelo recurso que dificultou a defesa da vítima e pelo meio cruel empregado, com a agravante de ter sido cometido contra pessoa com deficiência.
“Verifica-se que o contexto fático construído nestes autos indicam que o crime foi cometido em decorrência de ordem emanada do Primeiro Comando da Capital diante das suspeitas de que a vítima estava envolvida na prática de crimes sexuais contra crianças (motivo torpe), que o homicídio ocorreu quando a vítima estava em desvantagem numérica e com suas mãos amarradas para trás (recurso que dificultou a defesa da vítima) e que o réu desferiu contra a vítima 14 golpes de faca e, em seguida, desferiu um corte na região do pescoço (meio cruel)”, asseverou Pedrini.
Os demais réus, com exceção de A.M. da S.S., falecido no dia 5 de junho de 2015, foram pronunciados nos crimes de tortura e de corrupção de menor.
Devido ao número elevado de réus, à complexidade do crime, e às acusações diferentes que pesam sob eles, o magistrado decidiu por desmembrar o julgamento em duas sessões diferentes. Assim, no julgamento que será realizado amanhã, apenas o executor do homicídio, o réu L.P.B., será submetido ao crivo dos jurados. Os outros réus serão julgados menos de duas semanas depois, no dia 3 de setembro.
Vale ressaltar que nenhuma acusação feita à vítima Valdeir Ferreira Viega de abuso de menores foi confirmada até a presenta data.
Processo nº 0002659-84.2015.8.12.0021