Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso do Sul Comarca de Nova Andradina Primeira Vara Cível
Autos: 0805432-81.2015.8.12.0017 Autor: Newton Luiz de Oliveira Réu: Anaurelino dos Santos Ramos e Anaurelino dos Santos Ramos ME Sentença: 1-RELATÓRIO Newton Luiz de Oliveira, qualificado, ajuizou a presente ação de indenização por danos morais em desfavor de Anaurelino dos Santos Ramos e Anaurelino dos Santos Ramos ME, igualmente identificados. Alegou, em síntese, que fora alvo de várias matérias jornalísticas de cunho difamatório e calunioso de autoria da parte requerida, especificamente publicadas nos dias 4/12/2013, 6/12/2013, 7/1/2014, 23/1/2014 e 30/1/2014. Por isso, requereu a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais, em valor não inferior a R$20.000,00 (vinte mil reais); pugnou, também, sejam os réus condenados a se retratarem publicamente. Fez os demais requerimentos de praxe e juntou documentos de f. 11-130. Proferiu-se despacho de admissibilidade (f. 141). Os réus foram citados (f. 175). Em contestação (f. 176-182), a pessoa jurídica requerida Anaurelino dos Santos Ramos-ME, presentado por Anaurelino dos Santos Ramos, também requerido, arguiu preliminar de incorreção do valor da causa; requereu a retificação, com posterior levantamento das custas remanescentes. No mérito, disse que não teve “animus diffamandi”, uma vez que as matérias não foram apresentadas com o intuito de ofender/macular a índole do requerente. Requereu a improcedência. Réplica às f. 187-188. A tentativa de conciliação restou infrutífera (f. 200). O feito foi saneado (f. 202-204). Em audiência, foram ouvidas duas testemunhas (f. 212-213). As partes apresentaram suas derradeiras alegações (f. 217-218, autor; /f. 240-246, réus). Vieram conclusos. 2-MOTIVAÇÃO Inexistem preliminares ou nulidades a serem supridas, estando o processo apto à julgamento, de modo que passo ao mérito da questão. É sabido que o dever de indenizar está previsto no Código Civil, nos seguintes termos: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Assim, para configuração da responsabilidade civil, devem, necessariamente, estar presentes os seguintes pressupostos: a conduta ou o excesso no exercício do direito doloso ou culposo, o dano e o nexo causal. A Constituição Federal assegura, dentre os direitos e garantias fundamentais, de um lado, a inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, X) e, de outro, a liberdade de expressão e de informação (art. 5º, IX e XIV). No tocante ao último direito, existem duas vertentes da liberdade de informação: o direito de informar e o direito de ser informado. O direito de informar é o direito subjetivo dos órgãos de imprensa e, por sua vez, o direito à informação (ou de ser informado) é o direito difuso de todos os cidadãos, destinatários da informação. Sendo que o primeiro, o direito de informar, só existe e se justifica na medida do direito de todos a uma informação correta e imparcial. Acerca da liberdade de informação disserta José Afonso da Silva1 : A liberdade de informação não é simplesmente a liberdade do dono da empresa jornalística ou do jornalista. A liberdade destes é reflexa no sentido de que ela só existe e se justifica na medida do direito dos indivíduos a uma informação correta e imparcial. A liberdade dominante é a de ser informado, a de ter acesso às fontes de informação, a de obtê-la. O dono da empresa e o jornalista têm um direito fundamental de exercer sua atividade, sua missão, mas especialmente têm um dever. Reconhece-se-lhes o sentido original, do contrário, se terá não informação, mas deformação. Portanto, verifica-se que a liberdade de imprensa não é absoluta, sendo que o seu exercício não pode culminar em abuso/excesso, que gera ofensa a outros direitos tutelados pelo ordenamento jurídico e de idêntica importância. Deparando-se com a colisão de direitos fundamentais, o julgador deve observar o postulado da proporcionalidade para verificar se, no caso concreto, o grau de realização do interesse lesivo (liberdade de informação) justifica o sacrifício do interesse lesado (direito à imagem e à honra). No caso em tela, as notícias se referem ao “site” “Vale do Ivinhema Agora”, mais especificamente à “Coluna Foca Online”, redigida pelo requerido, também proprietário do sítio eletrônico. As cópias das notícias acostadas aos autos apresentam dentro de suas temáticas, a política do 1 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros: São Paulo, 38ª Edição, p. 249. Município de Nova Andradina, sendo que o requerente, à época, era presidente da Câmara de Vereadores. Analisando detidamente o conteúdo das publicações, não é possível afirmar que houve mero “animus narrandi” e objetividade nas informações veiculadas pelo “site”. A princípio, a ausência de objetividade é verificada quando da leitura dos textos, em que a menção de que a filha do requerente havia sido contemplada com a doação de um terreno pelo Município foi narrada, ao menos, em 4 notícias diferentes e em datas diversas, quais sejam: 4/12/2013, 6/12/2013, 7/1/2014, 30/1/2014. Embora argumente a defesa que o fato também foi noticiado por outros “sites” da região, isso não ilide a responsabilidade da parte requerida, pois é evidente que a narrativa se deu de forma tendenciosa e parcial, o que, de fato, compromete o direito à informação, em sua acepção inicial, conforme explanado anteriormente. Por outro lado, a parcialidade das informações é perceptível pela leitura das notícias, que descrevem o requerente como pessoa de índole ardilosa e traiçoeira, o que se extrai dos seguintes excertos: “Nenão despistou a CPI dos Terrenos, que pegaria três dos vereadores integrantes do “Grupo do Gilberto” com a “mão na massa” (f. 12); “E como não poderia deixar de ser diferente. O vereador Nenão tinha a sua filha como beneficiária de um lote no residencial Conjunto residencial Universitário” (f. 13); “Mas o Ministério Público enxergou possíveis irregularidades em situações que claramente o presidente Nenão vem levando vantagens em detrimento à lei. (…) Lógico que um político, entrando o ano presidindo a Câmara de vereadores, teria mil e uma facilidades para empregar esposa e a filha.(…)” (f. 34). Ainda, em diversas passagens dos textos, o editor utiliza expressões pejorativas para referir-se ao autor, como “rabo preso”, “joão sem braço”. Portanto, é visível o caráter injurioso das expressões utilizadas, que não eram dirigidas a outras figuras públicas, como os demais vereadores da época. Portanto, vislumbra-se que a parte requerida extrapolou o direito ao livre exercício da liberdade de imprensa, pois não se ateve à narrativa dos acontecimentos, ao tecer comentários acerca da pessoa do autor, com menção expressa a seu nome, de modo que as matérias perderam sua precípua finalidade, qual seja, de informar. Desse modo, é devida o ressarcimento em danos morais. No mesmo sentido entende o e. Superior Tribunal de Justiça, conforme a seguinte ementa: STJ-0718039) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA EM JORNAL DE GRANDE CIRCULAÇÃO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO JORNAL DE BRASÍLIA. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC/73 (ART. 1.022 DO NCPC). MATÉRIA JORNALÍSTICA OFENSIVA À HONRA DO AUTOR. DANO MORAL CARACTERIZADO. REFORMA DO ENTENDIMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DESTA CORTE. PLEITO DE REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. DESNECESSIDADE. VERBA FIXADA COM RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. 1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. Inexistentes as hipóteses do 1.022, II, do NCPC (art. 535 do CPC/73), não merecem acolhida os embargos de declaração que têm nítido caráter infringente. 3. O Tribunal de origem, após acurada análise do conjunto fático-probatório da causa, concluiu que o periódico, ao publicar matéria injuriosa contra o autor, extrapolou os limites do animus narrandi incorrendo em violação à sua honra, estando assim configurado o ato ilícito e o dever de indenizar. A reforma de tal entendimento encontra óbice na Súmula nº 7 do STJ. 4. A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que a revisão de indenização por danos morais só é possível em recurso especial quando o valor fixado nas instâncias locais for exorbitante ou ínfimo, de modo a afrontar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 5. Não se mostra excessivo o valor do dano moral fixado em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), sendo desnecessária a intervenção desta Corte para alterá-lo. 6. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, mantém-se a decisão proferida, por não haver motivos para a sua alteração. 7. Agravo interno não provido, com aplicação de multa. (AgInt no Agravo em Recurso Especial nº 969.870/DF (2016/0219905-2), 3ª Turma do STJ, Rel. Moura Ribeiro. DJe 11.04.2017). Assim, configurada a violação à dignidade da parte requerente, nasce o direito à indenização por dano moral, cujo valor fica ao prudente arbítrio do julgador, com seu subjetivismo e ponderação, de forma a compensar o dano e desencorajar reincidências do ofensor. Para aferição do valor devido, a jurisprudência estabelece que deverão ser observados os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, consoante o julgado a seguir apresentado: APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – DANO MORAL – INDENIZAÇÃO DEVIDA – QUANTUM MANTIDO – RAZOABILIDADE – FIXAÇÃO EQUITATIVA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO … O valor da indenização por danos morais, por não haver valores préfixados, deve ser estabelecido de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, observados os critérios de proporcionalidade e razoabilidade (TJMS. Segunda Câmara Cível. Apelação Cível n. 2011.013144-0. Desembargador Relator João Batista da Costa Marques. Diário da Justiça de 1-7-2011, página 32). Considerando a abrangência do “site” em que foram veiculadas as notícias, bem como o número de notícias a respeito do autor – um total de 5 (cinco) dentro do período de 2 (dois) meses, tomando como base o caráter pedagógico da reparação em danos morais, cujo fito é desencorajar a reincidência por parte do requerido, bem como observados os princípios anteriormente esposados, entende-se razoável a condenação ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em favor da parte autora. Quanto ao pleito de retratação pública, entendo que o pedido prospera. Assim, deverá a parte requerida realizar a publicação da presente sentença no “site” “Vale do Ivinhema Agora”, mais especificamente na “Coluna Foca Online”, a qual deverá ficar disponível pelo período de 60 (sessenta) dias, com a mesma visibilidade que as notícias que envolveram o requerente. 3-DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo procedentes os pedidos formulados para o fim de: 3.1. condenar a parte ré em reparação de danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), com juros de 1% (um por cento) ao mês e com correção monetária mensal pelo IGPM-FGV, ambos a partir da data do evento danoso (a correção monetária com base na Súmula de n. 362 do e. Superior Tribunal de Justiça). 3.2. Condenar a parte ré a realizar a publicar a presente sentença no “site” “Vale do Ivinhema Agora”, mais especificamente na “Coluna Foca Online”, a qual deverá ficar disponível pelo período de 60 (sessenta) dias, com a mesma visibilidade que as notícias que envolveram o requerente. Por conseguinte, julgo extinto o feito com resolução de mérito Condeno a parte ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 85, §3º, do CPC, estes no importe de 10% (dez por cento) do valor da causa, considerando os trabalhos realizados nestes autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. Cumpra-se. Nova Andradina, 06 de novembro de 2017. Ellen Priscile Xandu Kaster Franco Juíza de Direito Assinado Digitalmente